“Todo mundo espera alguma coisa de um sábado à noite”, já pregava o filósofo Lulu Santos. Mesmo com os nobres e lúbricos pensamentos de Lulu já enraizados na alma do povo, poucas almas poderiam imaginar um sábado (e seu desfecho), em plena Maringá, como no último final de semana: noite em que os Misfits (!) dividiram o palco com os Raimundos
Os punks empolgados, que não chegaram a lotar o Out, fizeram questão de exibir no peito a paixão pelos gringos, ícones do horror punk: era comum esbarrar em garotos e garotas com camisetas dos Misfits. O show, felizmente, teve som caprichado. Dava para ouvir bem de qualquer lugar da pista e até se aproximar do palco - graças a ausências dos setores “ultra-mega-vips”.
No show dos Misfits, metade do público não aprovou a performance do vocalista e baixista Jarry Only, que, embora fosse carismático - interagindo várias vezes com a galera -, não tinha a mesma pegada de Glenn Danzig e Michale Graves, seus digníssimos antecessores. Outra parte não se importou com as cordas vocais do único remanescente da formação original e aproveitou para curtir os bons momentos da apresentação, em que se destacaram “Dig Up Her Bones”, “Skulls” e “Die Die My Darling”, quase todas guardadas para um bis matador, com sete hits arrebatadores.
A divisão do público, com algumas pessoas decepcionadas, era visível. Houve quem preferisse se refugiar, em meio a bocejos, num canto mais distante do palco, aproveitando para sentar e se preparar para o show dos Raimundos.
Quando a turma de Digão e Canisso surgiu em cena, lá pelas 1h45, a casa caiu. Os Misfits não conseguiram causar um impacto semelhante. Os Raimundos exibiram um repertório vigoroso, que privilegiou as músicas do álbum “Só no Forevis” (1999), tocando “Mulher de Fases”, “Mato Véio”, “Carrão de Dois”, “A Mais Pedida”, “Aquela”, “Me Lambe” e até “Boca de Lata”, com Canisso assumindo o microfone, sozinho, acompanhado por uma gravação, enquanto mostrava o lado mais rap da banda.
A hibridação sonora, além da ausência de trajes exóticos, é a principal diferença dos Raimundos. Os caras mesclam rock com reggae, pop, elementos da música sertânica do Nordeste e, aqui e ali, no arranjo de uma e outra canção, até surgem silhuetas de heavy metal.
Os gringos dos Misfits, por outro lado, se limitam a, no máximo, o pop rock. São duas propostas radicalmente diferentes. Os Misfits influenciaram deus e o mundo, sendo gravados pelo Metallica e pelo Guns N’ Roses. Na noite em que as duas bandas dividiram o mesmo palco, o que surpreendeu foi a grandeza dos brasileiros: o peso dos versos e dos riff’s de “Eu Quero Ver O Oco”, o romantismo sacana de “Mulher de Fases”, a pauleira desbocada de “Puteiro em João Pessoa”.

Durante show em Maringá, Raimundos roubam a cena dos Misfits; leia a crítica